Trata-se de uma apresentação performativa, experimental e intermedia não ensaiada em colectivo com recurso a multimeios electrónicos audiovisuais e manequins entre outros objectos desenhados pela autora Isabel Maria Dos.
Pretendeu-se neste trabalho, em tempo real, explorar a plástica da composição resultante dos “diálogos” e conexões neurais entre seres vivos de espécies distintas – entre a autora, o bailarino e performer convidado Allan Moscon Zamperini* e um peixe vivo em um aquário, onde todos geram o cenário final, a obra final – conceito criado pela compositora autora e que tem vindo a ser objecto de reflexão, desenvolvimento e do seu interesse de estudo.
É ainda uma interpretação do excerto do texto/artigo da autoria de João Maria André, O PAPEL DAS HUMANIDADES NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA, com referência ao paradigma da liquidez ou da liquefação no mundo contemporâneo .
[…] Vivemos num mundo líquido, numa modernidade líquida […] Na modernidade líquida tudo tem uma existência efémera: as coisas e os objetos do consumo quotidiano, as instituições, as relações, o amor, o trabalho, a arte e a cultura. E porque tudo tem uma existência efémera, tudo é descartável: adquire-se, usufrui-se, possui-se para logo a seguir se trocar por outra coisa que vem substituir as anteriores no ciclo da nossa existência. E, assim, o grande problema da sociedade líquida é o lixo, aquilo que se deita fora porque deixou de ter o seu valor de novidade, aquilo que se esquece porque o seu lugar na nossa atenção foi substituído por algo que veio logo a seguir para preencher o nosso interesse e ocupar a nossa atividade. A vida líquida é a vida da sociedade de consumo em que os bens não têm valor próprio mas têm apenas o valor da sua novidade na forma como o eu vai preenchendo as suas satisfações e em que tudo, pessoas e coisas, é, afinal, objecto de consumo. A sociedade líquida é uma sociedade sem raízes, em que as grandes ideologias estruturadoras da praxis social cedem lugar às modas de pensamento e de opinião em permanente mutabilidade. A sociedade líquida é também uma sociedade em que as fidelidades afectivas são uma coisa do passado: as relações constituem-se e dissolvem-se com uma rapidez extraordinária, descartando-se amigos e amantes como quem muda de camisa para enfrentar um novo dia. É por isso que o mundo líquido é um mundo sem memória: o seu tempo é apenas o presente e as ofertas que ele quotidianamente disponibiliza. Ora um mundo sem memória é um mundo sem passado e um mundo sem passado é um mundo sem raízes. A sociedade líquida vive à superfície da terra, da água e do tempo, vive na espuma dos dias, não cuidando dos laços que a história estabelece entre os homens nem do peso arquitectónico que a tradição pode ter sobre a nossa existência. A sociedade líquida é uma sociedade em que os instantes se sucedem uns aos outros, como mosaicos que se justapõem, sem nexo de continuidade nem ancoragem recíproca. […]
Este trabalho foi apresentado pela primeira vez ao público integrado no projecto transdisciplinar da autora – entre Arte e Ciência [PAISAGENS NEUROLÓGICAS], na edição 2, em maio, na Sala do Carvão na Casa das Caldeiras – Universidade de Coimbra, 2014.
Fotografias – cortesia de José Crúzio
*Allan Moscon Zamperini | Vila Velha – Espírito Santo, Brasil
[nota biográfica] É estudante de Licenciatura em Dança na Universidade Federal de Pelotas, Brasil e Estudos Artísticos na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – dentro do programa PLI (Programa Licenciaturas Internacionais – CAPES). Com interesses em temas híbridos, arte da performance e dança contemporânea com desenvolvimento de trabalhos independentes na área de performance. Faz parte do GEFAC (Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra). Em Pelotas, no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, fez parte de projetos de extensão, ensino e pesquisa vinculados à universidade e relacionados com dança-teatro, performance e interdisciplinaridade. Participou do corpo de colunistas jovens do Portal Yah – site do Programa Rede Cultura Jovem onde se veiculam diversas informações sobre a criação artística dos jovens do estado do Espírito Santo (seu estado de origem), Brasil. Na coluna, escreveu sobre assuntos referentes as artes cénicas de um modo geral. Participou como Agente de Cultura Jovem, atuando como mediador e divulgador das ações de projetos artísticos beneficiados pelos editais de fomento à cultura do Programa Rede Cultura Jovem do estado do Espírito Santo, Brasil. Tem realizado trabalhos na área do teatro e vídeo.